Os amigos estão morrendo
São tantos que pareço ter 100 anos
Toda semana ou mês
lojas de livros usados oferecem-me
obras que a eles um dia autografei
Leio as dedicatórias
Todas de louvores à vida
Há autógrafos da Feira passada
e outros de longínquos 50 anos
Partiram deixando livros
Joias seletas nas prateleiras
iguais a pessoas preciosas
Logo descartados aos sebos
Quando não ao lixo nas calçadas
Seguros de vida os herdeiros festejam
Joias óbvias
Imóveis automóveis saldos bancários
para se digladiarem
Disputam mal os bens
Os amigos estão morrendo
que pareço ter 200 anos
Pranteio-os feito Cristo preso à cruz:
os professores os miseráveis
os livreiros as costureiras os carroceiros
A moça a quem escrevi um livro inteirinho
Meus amigos morreram todos
que pareço ter 300 anos
Mas vivo a paz de lutar contra os corruptos
os desmatadores os grileiros os banqueiros
os juízes injustos os garimpeiros
o presidentiranossauro-rex que odeia livros
e manda comprar fuzis em vez de alimentos
Sei que o destino da chegada é a partida
E como já se foram meus amigos todos
quem noticiará que virei pássaro outra vez
e parto de volta para a casa primeira?